domingo, 10 de junho de 2007

Crônica: Ano de vestibular

Ainda me lembro perfeitamente do dia que nos conhecemos.
Estávamos na mesma livraria. Ele com um grande e volumoso livro de capa preta, onde de longe se lia "Física Quântica". Fiquei adimirada, como um rapaz tão jovem, bonito e de aparência despojada..., com um livro daquele na mão.
Imediatamente depois, me envergonhei e escondi o livro de poesias que tinha em mãos.
_ O que ele vai pensar se me vir com um simples livro de poesias? Tenho que parecer inteligente. rapazes assim..., gostam de moças inteligentes.
Peguei logo o maior livro de matemática que vi e comecei a ler com ar de interesse pelo assunto (e logo eu, que odeio números, mas tinha um motivo de força maior...). Ao sair da livraria, ele me olhou e sorriu.
_ Consegui!!! ôpa, falei alto demais! Disfarcei e comentei: _ Mas, esse cálculo até que era fácil...
Ufa!!! Pararam de me olhar. Não me contive e perguntei a uma atendente se o rapaz sempre estava por ali.
_ Claro que sim, ele...
_ Desculpe, meu celular.
Atendi. Era a aminha melhor amiga. parece que ela adivinha. Contei a ela o que houve e perguntei o que fazer. Ela me aconselhou a continuar a agir exatamente como estava agindo.
Fui para casa pensando na rapaz. No outro dia após a aula voltei à livraria na esperança de encontrá-lo. E ele estava lá. Lindo. Suas calças folgadas, tênis, camisa preta, boné. Dessa vez estava com um livro de História do Brasil. (Que lindo, um Gênio rebelde!). Pensei em falar com ele, mas não sabia como começar o papo sem parecer uma burra. Sobre o que eu iria conversar com um garoto que lia tanto, sobre assuntos tão diferentes? Montei uma estratégia: peguei todas as minhas economias e no dia seguinte voltei e comprei vários livros de português, matemática, física, química, biologia... e comecei a "devorá-los". Minha mãe gostou tanto de me ver estudando que ganhei aumento de mesada - e duas semanas depois de tanto ler, voltei à livraria, dessa vez disposta a puxar um assunto, algo como: "tá quente hoje, né?" Consequências do efeito estufa.
Que rídiculo. Melhor não ensaiar. Chamei minha amiga para ir comigo. (É bom um apoio moral nessas horas!).
Chegamos e lá estava ele. Dessa vez estava com dois livros de geografia (A idéia do efeito estufa não foi tão ruim), cheguei até ele, respirei fundo e soltei um "oi" tímido.
_ Olá, respondeu ele.
_ Você gosta daqui, né?
_ É, até que é legal.
_ Você está aqui todos os dias?
_ De segunda a sábado.
_ Pelo menos, o domingo você tira para descansar, né?
_ Claro. Senão acabo enlouquecendo.
_ Ah, você estuda aqui perto?
_ Não, não estudo mais.
_Nossa, tão jovem. Já se formou?
_ Não, acho que você não entendeu. Eu parei de estudar na 8ª série, quando vim trabalhar aqui.
_ Você trabalha aqui???
_ Claro, sou entregador, o que você achou?
_ Nada. Eu tenho que ir. Até outro dia.
Que mico. Eu achando que... Tive que aguentar piadas da minha amiga por muito tempo.
Bom, mas nem tudo foi perdido. Não fiquei com o carinha, ele namora uma menina da 5ª série da minha escola, mas pelo menos algo de bom me aconteceu. Passei no vestibular de primeira.


Ahanna Tayra (3º ano, EEDNM)

3 comentários:

Textualidade disse...

Eu gosto dos textos de Ahanna. São críticos e inteligentes. Quando a sugestão é poesia, ela demonstra sensibilidade e certa angústia, mas a crítica parece ser sua marca.

Unknown disse...

Muito bom, na vida nada é por acaso
as pessoas passando por situações como essa, acabam adquirindo muitas experiências e essa foi a melhor que poderia acontecer..

PARABÉNS
CONTINUE ASSIM SEMPRE ADQUIRINDO MAIS E MAIS CONHECIMENTOS.

Unknown disse...

ADOREEEI. :)
Parabéns à escritora, texto bem articulado e engraçado.
tinha que ser aluna da minha mãe meesmo xD

Parabéns de novo :]

bjs
:*